Pedaço de Mim
A vida dum homem é uma doutrina, é um percurso mensorável, é um caminho
extreito ou largo entre as correntes das águas turvas dos rios ou das chuvas.
Não se traduz e nem se decifra o padrão do bom ou do mau homem ainda no berço,
apenas sonhamos o seu futuro e a realidade dos factos o dita. Nasci orfão de
pai poligamo, aos quatro de Março de mil, novecentos, oitenta e seis, em Maputo,
distrito de KaMaxaquene, a minha mãe era a terceira e a mais nova esposa do meu
pai e porque estava na terra idade, depois da morte do meu pai se casou
novamente, antes de se casar devido a obediença das nossas crências e custumes
tradicionais foi obrigada a se relacionar com o meu tio, irmão mais novo do meu
pai, com quem teve o meu irmão que me segue. Imagine o que isso originou para a
familia e como passamos a nossa infância, uma vez que o meu tio já era casado.
Na prior o meu irmão foi rejeitado e a minha mãe foi obrigada a sair da nossa
casa onde convivia com a sua irmã de lar que por acaso era também sua irmã de
sangue. Passamos maus bocados e a nossa educação foi manchada de muitas turbulências
familiares, e porque estavamos entregue a vida e a própria sorte, quando a
minha mãe se juntou maritalmente com o meu padrasto, este nos reijeitou porque
não éramos sangue do seu sangue. E ninguém fez nada da parte do meu pai,
refiro-me aos meus tios, apenas a minha avó nos levou para os seus cuidados,
que também não foram suficientes porque também tinha uma tropa dos seus filhos por
cuidar com o suor da enxada na plantação de arroz no Mini Golf em Maputo. E
para não termos falta de algo para comermos em casa dela onde havia muito milho
e arroz para ser processado, eu e o meu irmão mais velho, ja felecido passamos
a ser carregadores de mercadorias das senhoras que vendiam no mercado Xiquelene,
Mavalane e Delina, com os pés descalços ajudava ao meu irmão a impurar a
carrinha de duas rodas vulgo (tsova) no meu dialecto, no intervalo dos meus
sete a nove anos. Não sei se foi a vontade de Deus ou do meu pai mas por duas
vezes fiquei doente e tive que ser atendido pelo meu padrasto e pela minha mãe,
e nesse tempo o meu irmão que me tinha como o seu braço direito abandonou a
carrinha e refugiou-se na vida de menino de rua na Baixa da Cidade de onde veio
a contrair a doença crônica que lhe seifou a vida. Muito antes, a minha mãe foi
lhe resgatar para sua casa na altura Polana Caniço, donde não durou muito tempo,
porque não gostava do meu padrasto e ele também não gostava quase de ninguém de
nós. Q
uanto a mim o destino quiz que estivesse e crescesse ao lado deles até ao
fim da vida dele. Não nasci no berço do ouro, nem de prata muito menos de
bronze, se parecer isso, foi com muita
luta e muito sacrifício que a vida me deu para talvez ser exemplo de muitos que
deslixam as suas próprias vidas e se deixam marginalizar só pelos simples
factos de serem rejeitados ou deixados de lados ou para trás pelos seus
familiares. A vida é uma boa escola para cada um de nos não importa a condição
material, moral ou os meios com que vivemos e crescemos, no final o destino
tira em nos o seu belissimo exame. Se não fosse o que acima relatei talvez essa
altura teria sido um senhor das minhas próprias desgraças ou dum império
familiar deixado pelo meu pai dividido pelos herdeiros, lamentavelmente não
herdi nada apenas o nome e o apelido do meu pai, e a desgraça de ver os meus
irmãos a se acabarem com as bebidas alcoolicas e com as drogas como se a vida
não lhes valesse nada. Em parte digo que foi bom que não herdi nada porque
teria sido um tolo como muitos que no dia a dia nada fazem para o seu futuro se
não roubar aos que sacrificam-se em criar e realizarem os seus projectos e
sonhos.
Sanjo Muchanga